quinta-feira, 23 de junho de 2011

TPM

"Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso."

Clarice Lispector

sábado, 13 de novembro de 2010

"Vai, pois...

... come a tua comida e alegra-te com ela
Bebe o teu vinho com um coração feliz
Pois Deus já de antemão se agrada das tuas obras
Veste-te sempre de branco
E que nunca falte óleo perfumado nos teus cabelos
Goza a vida com quem amas
Todos os dias da tua vida fugaz
Porque esta é a tua porção nesta vida
Pelo trabalho com que te afadigaste sob o sol."

(Eclesiastes 9.7-9)

Linda esta passagem da Bíblia, que acabei de ler"por acaso".
E como diria um amigo muito querido:
"Obrigada meu Deus, por esta vida maravilhosa!!!"

domingo, 26 de setembro de 2010

A Descoberta

Isto eles já sabiam: havia os perfumes que ele mais apreciava, e sempre os chocolates e biscoitos prediletos na despensa, e dela havia as meias soltas sob as cobertas e enquanto divagava seu olhar se desviava para cima, as frases suspensas, as mãos se unindo como se unem as de uma criança. Ele gostava de abrir as embalagens meticulosamente sem rompê-las, mas a despia com a sede e a urgência de quem tem somente um segundo. Estavam então separados por apenas algumas horas, e era isto que os tornava agora, sozinhos em seus quartos, tão mais conscientes do silêncio. Se a este momento de ausência e arrebatamento ela juntasse papel e lápis, então o material e o abstrato, o interno e o epidérmico, tomavam forma em palavras escritas, cuidadosamente dispostas em versos ou crônicas. Ele dispensava as palavras. Sentado ao piano traduzia toda a subjetividade do que sentia em sons tangíveis, em melodia, tons, acordes e harmonia. Havia profundidade em ambos, e era assim que se percebiam, não só pelos gestos ou preferências, mas também através da Arte, pois neles emergia simbioticamente a necessidade de materializar a intensidade daquela sensibilidade em formas palpáveis, fossem versos ou música.
Assim apropriavam-se um do outro.

domingo, 19 de setembro de 2010

A Entrega

Ela estava inquieta. Relia as frases sem absorver-lhes o sentido, caminhava pela casa procurando algo, distraía-se, esquecia. Então buscava outro livro, abria-o aleatoriamente, lia algumas palavras, queria aquelas que traduzissem a intensidade daquilo que sentia. Não era enxergar as coisas com lentes cor-de-rosa. Via tudo tão transparente, as coisas tinham cor, cheiro e verdade. E era possível tocá-las, e o que ela sentia, ele incitava-a a falar.
Se ela se guardava poupando palavras, mascarando seus medos com cortinas de silêncio e displicência, ele percebia. Era pouco o tempo daquela intimidade, mas como ele lhe lia! Com algumas frases precisas, mas principalmente com o seu olhar, ele dissipava aqueles medos, trazia-a para outro lugar. E como era bom então estar ali. Aquele lugar existia! Tinha pés que se tocavam, mãos entrelaçadas, copo d'água, vela acesa, se ouvia risos na madrugada. Para que procurar palavras... Não havia mais limites para falá-las.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

As camélias sobre o musgo

" Quando senti pela primeira vez esse abandono delicioso que só é possível a dois? A quietude que sentimos quando estamos sozinhos, essa certeza sobre nós mesmos na serenidade da solidão, não são nada em comparação com o deixar-se levar, deixar-se ir e deixar falar que se vive com o outro, em companhia cúmplice... Quando senti pela primeira vez esse relaxamento feliz em presença de um homem? "

trecho de "A Elegância do Ouriço" de Muriel Barbery

terça-feira, 15 de junho de 2010

Divagando também


Quando despontaram as novas formas de comunicação e informação através de redes tecnológicas, quebrando todos os paradigmas de tempo e de espaço, as cogitações mais progressistas conduziam à crença de que se romperiam todas e quaisquer barreiras geográficas: o planeta seria unificado, globalizado, uno. Neste sentido, o que se viu é que a dimensão de “cidade” como limite territorial nuclear ganhou força e expressão dentro deste panorama universalizado. O caráter local, paradoxalmente, surgiu como uma nova forma de referência e identidade, fazendo um contraponto à desconstrução cultural advinda da globalização. Na verdade surgiram contrapontos em todas as áreas: às cadeias de fast food , o slow food e o critério da qualidade e do respeito a natureza; ao consumo intenso e desregrado de produtos descartáveis e poluidores, a produção ecológica e biodegradável.

Mas onde ficamos nós no meio disto tudo? Com que critérios gerenciamos nossa capacidade de discernir, fazer escolhas, optar? Enquanto a ecologia pode ser uma bandeira propícia utilizada por uma empresa para ampliar o consumo através do rótulo do “sustentável”, e as cidades podem ser travestidas com máscaras arquiteturais descontextualizadas para adaptarem-se a um modelo de marketing e incentivar o turismo, como está a percepção do homem destas realidades contraditórias? Confuso? Alerta? Disperso?

Enquanto seguimos rotineiramente acordando, comendo, exercendo nossa atividades profissionais, circulando catastroficamente pelas ruas congestionadas da cidade, somos massacrados por uma infinidade de informações, de todas as formas e suportes possíveis, que tentam nos vender idéias. A intensidade e a dimensão do acesso à comunicação ampliaram-se gigantesticamente, e foram sem dúvida o mote propulsor das mudanças em todos os outros contextos. A grande pergunta é: estamos conseguindo desfrutar com consciência desta panacéia de novas possibilidades que se estabeleceu em nossas vidas? Estamos mais próximos? Nos relacionamos mais e com mais naturalidade? Somos capazes de absorver a diversidade e a riqueza cultural que nos é oferecida pela quebra dos limites geográficos que as redes de comunicação nos proporcionam? Ou somos meros componentes de um sistema automatizado, teclando Ctrl C/CtrlV em nosso discurso diário, engolindo displicentemente garfadas de transgênicos, consumindo a cultura do global em detrimento da nossa própria? A escolha é nossa. Podemos optar se reciclamos ou não o nosso lixo; podemos optar se faremos parte desta ou daquela rede social, se vamos consumir fast food ou feira ecológica. Podemos fazer muitos amigos no orkut, e podemos também com um clicar de mouse, descartá-los. Acredito que há que se ter cuidado, para que nesta nova e quase divina possibilidade de seu livre arbítrio, o homem não se aproxime do mundo, mas esqueça do que lhe é peculiar, aquela dimensão de coisas e pessoas reais, que estão ali, bem ao seu lado.

E você, o que pensa a respeito?